novo artifo

July 11th, 2005
é assim mesmo pá

Monday 11 July 2005.

pois é mesmo verdade

Tive 30 no exame de Estatistica e acabei o curso (jà sò faltam as burocracias, o mais dificil de todos os exames). A partir de agora e para a ralé, é Dr. Xico Nhoca. Mais ainda informo os prezados leitores que chegarei a

Lisboa na 6a feira, pelas 18h30.

Dispenso os banhos de multidao e as comitivas de recepçao. Coisas simples serao apreciadas. A quem, por razoes de agenda, nao for possivel ir esperar-me ao aeroporto, comunico que tenciono deslocar-me ao bairro alto depois de escurecer. Quando menos o esperarem, estarei ao vosso lado, concedendo-vos o privilégio de rodar-me uma ganza do tamanho do “défice orçamental”.

TIQQUN A Comunidade Terrivel

July 8th, 2005
Friday 8 July 2005.

Génese

ou história de uma história há qualquer coisa da pobre e breve infância, qualquer da felicidade perdida que não se rencontra, mas também qualquer coisa da vida activa de hoje, da sua pequena vivacidade incomprensivel sempre presente, e que não se sabe como matar. F. Kafka

…deita rosas no abismo e diz: “aqui está o meu agradecimento ao monstro que não me conseguiu engolir”

F. Nietzsche, Fragmentos Póstumos

1. “Aquilo que num tempo foi comprendido num tempo foi esquecido. Até ao ponto em que já ninguém se apercebe de que a história não tem época. De facto nada acontece. Já não existe o evento. Existem só noticias. Olhar os personagens que chefiam o império. E arruinar o mote de espinoza. Nada a comprender, só a chorar, ou a rir”

M. Tronti, La politica al tramonto

1 bis. Acabou o tempo dos heróis. Desapareceu o espaço épico do conto que nos apraz contar e que nos apraz ouvir, que nos fala daquilo que poderiamos ser mas não somos. O irreparável é hoje o nosso ser-assim, o nosso ser-ninguém, o nosso ser Bloom.1

2. Não é agora o tempo de sonhar aquilo que seremos, aquilo que faremos, agora que podemos ser tudo, que podemos fazer tudo, agora que nos é concedida toda a nossa potência, com a certeza de que o esquecimento da alegria nos impedirá de a dispersar. É aqui ao ocorre abandonar-se ou morrer. O homem é verdadeiramente algo que deve ser superado, mas para isso deve antes ser ouvido naquilo que tem de mais exposto, de mais raro, para que o que resta não se perca na passagem. O Bloom, residuo ridiculo de mundo que não pára de o trair e de exilá-lo, exige fazer as bagagens: exige o exôdo.

2 bis. Do fundo deste exilio provêm todas as vozes, e neste exilio se perdem. O outro não nos acolhe, reenvia-nos ao outro que há em nós. Abandonamos este mundo em ruinas sem remorsos e sem piedade, empurrados de um vago sentido de pressa. Abandonamo-lo como ratos que deixam um navio, sem que saibam se está ancorado a um porto. Nada de “nobre” nesta fuga, nada de grande que possa ligar-nos uns aos outros, no fim permanecemos sós com nós próprios, porque não decidimos combater mas conservarmos-nos. E isto não será ainda uma acção, mas uma reacção.

3. Uma multidão de homens que foge é uma multidão de homens sós.

4. Não se encontrar é impossivel: os destinos têm o seu próprio clinamen2. Mesmo no leito da morte, na ausência de nós próprios, os outros não param de sev chocar no terreno liminare da fuga. Nós e os outros: separamos-nos por desgosto, mas não conseguimos unirmos por escolha. E no entanto encontramos-nos unidos, unidos e fora do amor, ao descoberto e sem proteção reciproca. Assim éramos antes da fuga. Assim somos desde sempre.

5. Não queriamos apenas fugir, ainda que tenhamos deixado este mundo porque nos parecia intolerável. Sem cobardia: fizemos as malas. O que queriamos não ela lutar contra um qualquer, mas com um qualquer. E agora que não estamos mais sós calaremos esta voz que vem de dentro, para alguns seremos Companheiros, não seremos mais os indesejáveis. Será necessário o esforço, será necessário o calar, porque até agora ninguém nos quis, agora as coisas mudaram. Não fazer perguntas, aprender o silêncio, aprender a aprender. Porque a liberdade é uma forma de disciplina.

6. A palavra faz-se antes, prudente, prenche os espaços entre as singulares solidões, dilata os agregados humanos em grupos, empurra-os juntos contra o vento, o esforço reune-os. É quase un exodo. Quase. Mas nenhum caminho os mantem juntos, se não a espontaneidade dos sorrisos, a crueldade inevitável, os acidentes de paixões.

7. Esta passagem, parecida com aquela dos pássaros migrantes, ao murmúrio das dores errantes, dá pouco a pouco forma ás Comunidades Terriveis.

Efectividade do porquê é que a esquizofrenia é mais do que uma doença e de como, mesmo sonhando com o extâse, se chega á endovigilância.

1. “Dizem-nos: o esquizofrénico também tem uma pai e uma mãe? Lamentamos responder Não, pelo menos enquanto tal: tem somente um deserto e as tribos que lá habitam, um corpo cheio e multiplicidades que se atacam entre elas”.

G. Deleuze, F. Guattari, Mille Piani

1 bis. A COMUNIDADE TERRIVEL é a única forma de comunidade compativel com este mundo, com o Bloom. Todas as outras comunidades são imaginárias, não impossiveis mas possiveis só a momentos e, de qualquer modo, nunca na plenitude da sua actuação. Emergem nas lutas e são então heterotopias, zonas opacas ausentes de qualquer cartografia, perpetuamente em acto de constituição e em via de desaparecimento.

2. A COMUNIDADE TERRIVEL não é só possivel; é já real, está já activa. É a comunidade dos que sobram. Nunca é potente, não tem devir nem futuro, nem fins verdadeiramente externos a si, nem desejo de se tranformar em outra coisa, só desejo de persistir. É a comunidade do atraiçoamento, luta contra o seu próprio devir: trai-se sem se transformar nem verdadeiramente transformar o mundo à sua volta.

2 bis. A COMUNIDADE TERRIVEL é a comunidade dos Bloom, porque no seu interno nenhuma desubjectivização tem direito a existir. De fora, para lá entrar é primeiro preciso meter-se entre parentesis.

3. A COMUNIDADE TERRIVEL não existe, senão nos dissensos que momentaneamente a atravessam. No resto do tempo a comunidade terrivel simplesmente é, eternamente.

4. APESAR DISTO, a comunidade terrivel é a unica a encontrar-se dado que o mundo, enquanto lugar fisico do comum e da condivisão, desapareceu e dele não resta que uma Quadrillage imperial a percorrer. A mentira do “homem” já não encontra mais mentirosos que a afirmem. Os não-homens, os já-não-homens, os bloom renunciaram a sonhar, habitam distopias organizadas, lugares sem lugar, intersticios sem dimensão das utopias mercantis. São planos e unidimensionais porque, não se reconhecendo em lugar algum, nem em si próprios nem nos outros, não reconhecem nem o seu passado nem o seu futuro. Dia após dia a sua resignação apaga o presente. Os já-não-homens populam a crise da presenza.

5. O TEMPO da comunidade terrivel é espiraloforme e de consistência viscosa. É um tempo impenetrável no qual a forma-projecto e a forma-hábito se penduram sobre a vida deixando-a privada de profundidade. Podemos definilo como o tempo da liberdade ingénua, no qual todos fazem aquilo que querem. Porque é impossivel querer algo para além do que já existe. Podemos dizer que é o tempo da depressão clinica, ou o tempo do exilio e da prisão. É uma espera sem fim, um esticar uniforme de descontinuidades desordenadas.

6. O CONCEITO DE ORDEM na comunidade terrivel foi abolido para dar lugar à efectividade da relação de força e ao conceito de forma para vantágem da prática da formalização, que, não tendo controle sobre os conteúdos à qual se aplica, é eternamente irreversivel. Á volta de falsos rituais, falsos prazos (manifestações, férias, assembleias várias, reuniões mais ou menos festivas), a comunidade coagula-se e formaliza-se sem nunca tomar forma. Porque a forma, sendo sensivel e corruptivel, expõe ao devir.

6 bis. NO SEIO da comunidade terrivel a informalidade é o meio mais apropriado à construção inconfessada de impiedosas hierarquias.

7. A REVERSEBILIDADE é o signo sob o qual se coloca cada evento que tem lugar na comunidade terrivel. Mas é esta mesma reversibilidade, com o seu séguito de medos e de insatisfações, que é irreversivel.

8. O TEMPO da reversebilidade infinita é um tempo ilegivel, não-humano. É o tempo das coisas, da lua, dos animais, das marés, não dos homens, e muito menos dos já-não-homens, porque estes últimos já não são capazes de pensar, enquanto os outros ainda conseguiam o tempo da reversibilidade não é mais do que o tempo daquilo que é irreconhecivel a si próprio.

9. PORQUE não abandonam os homens a comunidade terrivel – perguntar-se-á. Podemos responder que é devido ao facto de que o mundo já-não-mundo é ainda mais inabitável do que esta; mas cairiamos na armadilha das aparências, numa verdade superficial, porque o mundo é tecido da mesma inexistência agitada da comunidade terrivel: há entre eles uma continuidade escondida que para os habitantes do mundo e para aqueles da comunidade terrivel continua indecifrável.

10. AQUILO que é sublinhado é que o mundo extrai a sua própria existência minima, que nos consente de decifrar a inexistência substancial da existência negativa da comunidade terrivel (por marginal que possa ser) e não, como se poderia crer, o contrário.

11. A EXISTÊNCIA NEGATIVA da comunidade terrivel é em última análise uma existência contra-revolucionária, já que defronte á subsistência residual do mundo contenta-se de querer só uma maior plenitude.

12. A COMUNIDADE TERRIVEL é terrivel porque se autolimita, ainda que não repouse en nenhuma forma, porque não conhece o extase. Raciocina com as mesma categorias do mundo já-não-mundo, sem que nem sequer tenha razões para o fazer. Conhece os direitos e as indiferenças , mas codifica-as na base de uma falta de coerência do mundo que contesta. Critica a violação de um direito, mete-a a descoberto, chama a atenção. Mas quem estabeleceu (e violou) tal direito? O mundo ao qual se recusa pertencer. E dirige o seu discurso à atenção de quem? Do mundo que nega. O que deseja então a comunidade terrivel? O melhoramento do estado actual das coisas. E o que deseja o mundo? A mesma coisa.

13. A DEMOCRACIA é o caldo de cultura de cada comunidade terrivel. O mundo já-não-mundo é o mundo no qual o litigio original e fundador do politico se desvanesce em favor de uma visão festora da vida e do vivente, o biopoder. Neste sentido, a comunidade terrivel é uma comunidade biopolitica porque também essa fundamenta a sua unanimidade massiça e quase militar no apaziguamento do litigio fundador do politico, o litigio entre formas-de-vida. A comunidade terrivel não pode permitir que no seu seio exista um bios, uma vida não conformada conduzida livremente, pode só permitir uma sobrevivência nos seus ranques. Do mesmo modo a continuidade escondida entre a democracia e as comunidade terriveis depende do facto de que entre os dois o litigio foi abolido, impondo uma unamidade que é ao mesmo tempo desigualmente condivisa e violentamente reclusa numa colectividade que deve tornar possivel a liberdade. Acontecerá então, paradoxalmente, que os ranques da democracia biopolitica sejam mais confortáveis do que os das comunidades terriveis, já que o campo de jogo, a liberdade dos sujeitos e as constrições impostas pela forma politica são, num regime de verdade biopolitica, inversamente proporcionais.

14. QUANTO MAIS um regime de verdade biopolitica pretenda uma abertura à liberdade, mais será um regime policial e, delegando à policia o dever de reprimir as insubordinizações, mais deixará os seus sugeitos num estado de relativa inconsciência, de quase-infância. Para compensar, num regime de verdade biopolitica no qual se pretende realizar a liberdade sem meter em discussão a forma, exigir-se-á dos que participam que introduzam a policia no próprio bios, com o potente protesto de que não existe outra escolha. Escolher a pseudo-liberdade concedida pelas democracias biopoliticas – quer seja por necessidade, por jogo ou por sede de prazer – por quem fez parte de uma comunidade terrivel equivale a uma degradação ética real, porque a liberdade das democracias biopoliticas não é outra que a de se poder comprar e de se poder vender.

15. DO MESMO MODO , do ponto de vista das democracias biopoliticas unificadas em Império, aqueles que se alinham com as comunidades terriveis passam de um regime politico de troca mercantil (de gestão) a um regime politico militar (de repressão). Agitando o espectro da violência policial, as democracias biopoliticas conseguem militarizar as comunidades terriveis, a tornar a sua disciplina interna ainda mais dura do que noutros sitios; e isto com o fim de produzir um crescendo que torne eventualmente preferivel a mercadoria à luta; a liberdade de circulação, entusiasticamente recomendada da policia e da propaganda mercantil – “circular, aqui não há nada a ver!” – à liberdade de ver o outro, o confronto, por exemplo. Para aqueles que aceitam trocar a liberdade mais altas, a de poder lutar, pela liberdade mais reificada, aquela de comprar, há vinte anos que as democracias biopoliticas dispõem confortáveis postos de empreendedore biopolitico absolutamente em voga, enquanto não proliferam universalmente os fight clubs, os ginásios, as agências de publicidade, os bares na moda cresceram exponecialmente com as carrinhas de bófias. E as comunidades terriveis serão o modelo desta nova mudança da evolução mercantil.

16. Comunidades terriveis e democracias biopoliticas podem coexistir numa relação vampiresca, ambos vivem a si próprios como mundos já-não-mundos, isto é, como mundos sem exterior. O seu ser-sem-exterior não é uma convenção terrorista agitada para garantir a fidelidade dos sugeitos que fazem parte da democracia biopolitica ou da comunidade terrivel, mas é uma realidade na medida em que se tratam de duas formações humanas que sobrepõem quase completamente. Não há partecipação consciente na democracia politica sem uma participação inconsciente numa comunidade terrivel, e vice-versa. A comunidade terrivel não é só uma comunidade de contestação social ou politica , uma comunidade militante, mas tendencialmente é tudo aquilo que procura esistir como comunidade no interno da democracia biopolitica (a empresa, a familia, a associação, o grupo de amigos, o bando de adolescentes. E isto na medida em que cada condivisão sem fim – em ambos os sentidos da expressão – é uma ameaça efectiva à democracia biopolitica, que se funda numa separação em que os seus sugeitos já não são nem sequer individuos, mas dividuos divididos entre duas participações necessárias e também contraditórias, a comunidade terrivel e a democracia biopolitica. No mesmo modo uma das duas participações deve ser vivida como clandestina, indigna, incoerente. A guerra civil, expulsa da publicidade, refugiou-se no interno dos dividuos. A linha da frente, que já não passa no meio da sociedade, coloca-se agora no meio do bloom. O capitalismo exige a esquizofrenia.

17. O PARTIDO IMAGINÀRIO é a forma que assume esta esquizofrenia quando se torna ofensiva. Está-se no partido imaginário não quando não se está na comunidade terrivel ou na democracia biopolitica, mas quando se age para destruir ambos.

18. AQUILO QUE SE DEFORMA deforma-se, mas não pode ser destruido. E no entanto a vida entre os massacres não é só possivel, mas efectivamente presente. A inteligência superior do mundo está na comunidade terrivel. A salvação do mundo enquanto mundo, que persiste no seu estado de relativa decomposição, residirá portanto no adversário que jurou destrui-lo. Mas como poderia este adversário destrui-lo, se não pagando o preço do seu próprio desaparecimento enquanto adversário? Poderia, dizem-nos, constituir-se positivamente, fundar-se, dar-se leis próprias. Mas a comunidade terrivel não tem vida autonoma, não encontra em lado algum o acesso ao devir. É só a ultima astúcia de um mundo em desagregação para sobreviver mais um pouco.

Afectividade

do porquê do frequente desejo por aquilo que faz a nossa infelicidade (tanto que se chega a ter saudades dos belos tempos dos casamentos combinados). e da razão de as mulheres não dizerem aquilo que pensam. fala-se também da insuficiência das boas intenções. Atenção! Capitulo de leitura perigosa já que todos são postos em causa.

GIOCASTA O que é o exilio? De que sofre o exilado? POLINICE Do pior dos males: de não poder dizer a verdade GIOCASTA É de escravo não poder dizer o que se pensa. POLINICE E dever dobrar-se perante a imbecilidade de quem comanda… GIOCASTA Sim, é isto, fazer de estúpido entre os estúpidos POLINICE Por interesse violenta-se o próprio temperamento.

Euripide, AS FENICIAS

1. A PARREHSIA é o uso perigoso, afectual do discurso, o acto de verdade que mete em discussão as relações de poder assim como elas são hic et nunc na amizade, na politica, no amor. O parrhesiastes não é aquele que que diz a verdade mais dolorosa para destruir as ligações que unem os outros e que se fundam na recusa de aceitar essa verdade como invencivel. Quem faz uso da parrehsia mete em perigo em primeiro lugar a si próprio, expondo-se nos tecidos relacionais. A parrehsia é o acto de verdade que esclarce um ponto de vista superior em relação às coisas. Onde a parrehsia não é possivel, o seres estão em exilio, agem como escravos. Ainda que, para quem nela habita, a comunidade terrivel é como uma catedral no deserto, é no seu interior que se sofre o exilio mais amargo. Porque enquanto máquina de guerra unilateral, que deve manter um equilibrio homeostático vital com o exterior, a comunidade terrivel não pode tolerar que nos seus ranques possam circular discursos perigosos para si própria. Para se poder perpetuar a comunidade terrivel tem a necessidade o perigo ao seu exterior: será o Estrangeiro, a Concorrência, o Inimigo, os Bófias. Assim a comunidade terrivel aplica no seu interior o mais rigido policiamento discursivo, tornando-se na propria censura.

2. ONDE A PALAVRA muda da repressão faz ouvir a sua voz, nenhuma outra palavra tem direitos de cidadania enquanto estiver excluida de uma efectividade imediata. A comunidade terrivel é uma resposta à afasia que todos o regime biopolitico impõe, mas é uma resposta insuficiente porque se perpetua por censura interna, reproduzindo assim a ordem simbólica do patriarcado. Portanto, muitas vezes não é mais que uma outra forma de policia, um outro lugar no qual se permanece no analfabetismo emocional ou num estado de menoridade infantil, com o pretexto de uma ameaça externa. Porque a a criança não é tanto aquele que não fala, mas aquele que é excluido dos jogos de verdade.

3. O MUNDO JÀ-NÃO-MUNDO, este mundo esquartejado vive na autocelebração patética que se chama, ainda, “espectáculo”. O espectáculo roça o dúbio, reduz a consciência a uma passividade anestisiante. Aquilo que a democracia biopolitica pede à consciência é de ajudar à destruição, não enquanto destruição efectiva, mas enquanto espectáculo. Enquanto a comunidade terrivel pede que se ajude à destruição enquanto destruição, de modo a alterná-la, para que possa durar, com breves periodos de reconstrução colectiva.

3 bis. NÃO HÁ NENHUM DISCURSO de verdade, há só dispositivos de verdade. O espectáculo é o dispositivo de verdade que consegue fazer funcionar em sua vantagem qualquer outro dispositivo de verdade. Espectáculo e democracia biopolitica convergem no aceitar de qualquer regime de discurso falso, pronunciado por qualquer sujeito, que permita o perpetuar da paz armada vingente. A proliferação das insignificâncias visa cobrir toda a extensão do existente.

4. A COMUNIDADE TERRIVEL conhece o mundo, mas não se conhece. Isto porque é, no seu aspecto afirmativo, um ser não reflexivo, mas estagnante. Para compensar, no seu aspecto negativo, existe na medida em que nega o mundo, e portanto a si própria, sendo feita à sua imagem. Não há nenhuma consciência para cá da existência, e nenhuma autoconsciência para cá da actividade, mas sobretudo, não há consciência na actividade de inconsciente autodestruição. A partir do momento em que a comunidade terrivel se perpetua agindo sobre o olhar hostil do outros, absorvendo este olhar como objecto e não como sujeito de tal hostilidade, esta pode amar e odiar só por reacção.

5. A COMUNIDADE TERRIVEL é um aglomerado humano, e não um grupo de companheiros. Os membros da comunidade terrivel encontram-se e agregam-se infelizmente mais por acaso do que por escolha. Não se acompanham, não se conhecem.

6. A COMUNIDADE TERRIVEL é atraversada de todos os tipos de cumplicidades – como poderia sobreviver de outra maneira? – mas diversamente dos antepassados dos quais se reinvidica herdeira, tais cumplicidades não determinam em nenhum caso a sua forma. A sua forma é no entanto a desconfiança. Os membros da comunidade terrivel desconfiam uns dos outros, porque nada conhecem nem de si nem dos outros e porque nenhum deles conhece a comunidade da qual faz parte: trata-se de uma comunidade da qual não há conto possivel, portanto impenetrável e impossivel de expremir senão na imediateza inorganica, mas ainda, é uma imediateza inorganica, que não revela nada. A exposição que ali se pratica é mundana e não politica: até na solidão heróica do amotinado aquilo que se estima é o seu corpo em movimento e não a coerência entre este corpo e o seu discurso. Razão pela qual a clandestinidade, o passa-montanha e o jogo da guerra fascinam e enganam ao mesmo tempo: o policia provocador é também ele um amotinado…

6 bis. “TERÀ QUE SE LIDAR com um dispositivo de desconfiança total e circundante, porque não há nenhum ponto absoluto. A perfeição da vigilância é uma soma de malevolências”.

M.Foucalt em Panóptico

7. TODAVIA DADO QUE as cumplicidades existem, os membros das comunidades terriveis suspeitam que exista também um projecto, o qual porém lhes escapa. Daqui nasce a desconfiança. A desconfiança que sentem reciprocamente os membros da comunidade terrivel é muito maior dauqela que nutrem em relação os cidadãos do resto do mundo: estes últimos, na verdade, não se escondem do facto de terem muito a esconder, conhecem a imagem que é suposto terem e foerecerem ao mundo do qual fazem parte.

8. SE APESAR do seu panoptismo interno, a comunidade terrivel não se conhece, é porque não é conhecivel, e nesta medida, e tão perigosa para o mundo quanto para si própria. É a comunidade da inquietude, mas desta inquietude é também a primeira vitima.

8 bis. A COMUNIDADE TERRIVEL é uma soma de solidões que se vigiam sem se proteger.

9. O AMOR entre os membros da comunidade terrivel é uma tensão inexausta que se nutre daquilo que o outro vela e não revela: a sua banalidade. A invisibilidade da comunidade terrivel a si própria consente-a de amar-se a si própria.

10. A PRÓPRIA IMAGEM pública exterior é aquilo que interessa menos à comunidade terrivel, porque é consciente de ser postiça. Igualmente enganadora é a imagem de si que a comunidade invisivel difunde no seu interior, mas da qual ninguém se deixa enganar. Porque aquilo que mantém junta a comunidade terrivel é aquilo que se encontra para cá da própria publicidade, aquilo que apenas deixa ver aos seus membros e apenas deixa adivinhar ao exterior. É informada da banalidade do seu privado, do vazio do seu segredo e do segredo do seu vazio; por isto, para perpetuar-se, produz e segrega a comunidade pública.

10 bis. A BANALIDADE DO PRIVADO das comunidades terriveis esconde-se porque essa banalidade é a banalidade do mal.

11. A COMUNIDADE TERRIVEL não repousa em si própria, mas no desejo que o exterior lhe põe eem cima, que toma inevitavelmente a forma de mal-entendido.

12. A COMUNIDADE TERRIVEL, como todas as formações humanas nas sociedades capitalistas avançadas, funciona com uma economia de prazer sado-masoquista. A comunidade terrivel, diversamente de tudo o resto, não admite o próprio masoquismo fundamental, e os desejos nos quais participa prendem-se a este mal-entendido. O “selvagem” suscita desejo, mas este desejo é um desejo de domesticação, e portanto de aniquilição; assim como a criatura comum, confortavelmente sentada no próprio quotidiano, é erótica só na medida em que se quereria manchar-lhe irreparavelmente a pureza. O facto que este metabolismo emotivo continue escondido é uma continua fonte para os membros da comunidade terrivel, que se tornam incapazes de avaliar as consequências dos seus gestos afectivos (consequências que desmentem constantemente as suas previsões). Os membros das comunidades terriveis desaprendem assim progressivamente a amar.

13. A EDUCAÇÃO SENTIMENTAL no seio da comunidade terrivel funda-se na humilhação sistemática, na pulverização da autoestima dos seus membros. Ninguém se pode crer portador de uma forma de afectividade que tenha direitos de cidadania na comunidade. O tipo hegemónico de afectividade no interior da comunidade terrivel corresponde paradoxalmente à forma que no exterior é percebida como a mais atrasada. A tribo, a vila, o clan, o grupo, o exércio, a familia são universalmente reconhecidos como as formações humanas mais crueis e menos gratificantes, mas persistem, obstante tudo, no interior da comunidade terrivel. As mulheres devem assumir um tipo de virilidade cho hoje em dia nas democracias biopoliticas até os machos recusam; e tudo isto percebendo-se como mulher de feminilidade defeituosa em relação à fantasia masculina dominante também no seio da comunidade terrivel, que é a mulher plástica e “sexy” (a imagem de puro invólucro de carne que é a jeune-fille) a uso e consumo da sexualidade genital.

14 bis. EM CADA comunidade terrivel acontece a experiência do estupefacente silêncio das mulheres. De facto, a patofobia da comunidade terrivel manifesta-se regularmente como repressão indirecta da palavra femenina, estranha e inquietante porque palavra de carne. Não é que se façam calar as mulheres; simplesmente a fronteira com a loucura, na qual a sua palavra de verdade se poderia dar, é directamente apagada dia após dia.

15. “NÃO É QUE AS MULHERES demorassem mais a cumprir as acções: elas eram as mais corajosas, mais capazes, mais preparadas e mais motivadas que os homens. Mas era-lhes concedida menos autonomia no plano da iniciativa: era como se florescece instintivamente uma diferença na preparação e nas discussões colectivas, e o seu voto contasse menos. O problema estava no grupo: era um comportamento anódino, um silêncio, ou mesmo um “está calada!” lançado em plena discussão [...] Esta espécie de descriminação não era o resultado de uma discussão prévia, era algo que vinha do externo, em parte inconscientemente, algo que estava para lá da vontade. Algo que não se podia resolver com uma declaração ideológica ou com uma escolha racional”. I. Faré, F. Spirito, Mara e le altre

15 bis. SENDO QUE A COMUNIDADE TERRIVEL se baseia em relações inconfessadas, acaba inevitavelmente por se afundar nas relações mais residuais e “primitivas”. As mulheres estão destinadas à gestão das coisas concretas, das tarefas comuns, e os homens à violência e à direcção. Nesta esquálida reproducção de já obsoletos clichés sexuais, a única relação possivel entre um homem e uma mulher é uma relação de sedução, mas como a sedução generalizada poderia levar á explosão da comunidade terrivel, esta é severamente conduzida na forma do casal, heterosexual e monogâmico, que é dominante.

16. “É VERDADE QUE OS GRUPOS se desgastam por acção de forças muito diversas, que produzem neles núcleos internos de tipo conjugal e estatal, e que os levam a uma outra forma de socialidade, preenchendo os afectos de rebanho com sentimentos familiares ou intelegibilidade de Estado. O centro ou os buracos negros internos exercem a função principal. Nisto o evolucionismo pode ver um progresso, na aventura que acontece também aos grupos humanos quando reconstituem um familiarismo de grupo, ou também um autoritatismo, um fascismo de rebanho”.

G. Deleuze, F. Guattari, Mille Plateaux

16 bis. TAMBÈM AS AMIZADES, no seio da comunidade terrivel, reentram no imaginário estilizado e raquitico que contradistingue cada sociedade heterosexual e monogâmica. Pois que as relações interpessoais nunca devem ser postas em discussão e são obrigadas a “ser expiadas”?? , a questão das relações homem-mulher não deve ser tocada e é sistematicamente resolvida “à antiga”, de maneira proto-burgues ou vetero-proletária. As amizades permanecem então rigorosamente monosexuais, homens e mulheres desgastam-se numa inderrotável estranhidade, que lhes permitirá, no momento certo, de formar eventualmente um casal.

17. O FAMILIARISMO não implica de modo algum a existência de familias reais; aliás, a sua difusão maciça acontece no momento mesmo no explode a familia enquanto entidade fechada, contaminando por reacção toda a esfera de relaçõas que até agora lhe escapavam. “O familiarismo consiste no negar magicamente a realidade ocial, no evitar todas a conecções com os fluxos reais” (F. Guattari, A Revolução Molecular). Quando a comunidade terrivel, para se reassegurar, nos diz que no fundo não é mais do que “uma grande familia”, volta-nos á ideia o arbitrio, a reclusão, a moleza e o moralismo que acompanharam a instituição familiar na sua existência histórica; só que agora, com o pretexto de nos preservar, tudo isto é imposto sem a instituição, isto é, sem a possibilidade de o denunciar.

17 bis. A PARTE DE HUMILHAÇÃO e de vilificação dos homens consiste na obrigação de exibir constantemente as próprias capacidaes numa qualquer forma de perfomance virilóide. O Contratipo não tem espaço na economia afectiva da comunidade terrivel, na qual só o estereotipo, em última análise prevalece, só o lider é objectivamente desejável. Qualquer outra posição é insustentável sem admitir implicitamente uma incapacidade congénita de existir singularmente; mas os despojos relativos aos estéreotipos são alimentados sem pausa pelo impiedoso metabolismo afectivo da comunidade terrivel. Quando o Contratipo, por exemplo, procurar disfarçar-se de si próprio, será empurrado com violência para dentro da cela da mesma “insuficiência”. O contratipo-bode expiatório funciona para todos como um espelho deformante, que reassegura perturbando. Implicitamente, permanece-se na comunidade terrivel para não ser nem o Lider nem o contratipo, enquanto eles permanecem porque não têm escolha.

18. TODA A COMUNIDADE TERRIVEL tem o seu lider, e vice-versa.

18 bis. EM TODOS OS LUGARES ONDE AS RELAÇÕES não são problematizadas, as formas antigas reflorescem em toda a potência da sua brutalidade adiscursiva: o forte prevalece sobre o fraco, o homem sobre a mulher, o adulto sobre a criança e assim por diante.

19. O LIDER não necessidade de se afirmar, pode até brincar e fingir que é o contratipo ou ironizar a sua virilidade. O seu carisma não tem necessidade de performances, porque é objectivamente suportado pelos parametros biométricos dos desejos da comunidade terrivel e da efectiva submissão dos outros homens e mulheres.

20. O SENTIMENTO FUNDAMENTAL que liga a comunidade terrivel ao seu Lider não é a submissão mas a disponibilidade, isto é, uma variante sofisticada da obediência. O tempo dos membros da comunidade terrivel deve continuamente passar pela peneira da disponibilidade: potencial disponibilidade sexual relativa ao Lider, disponibilidade fisica para as mais diversas tarefas, disponibilidade afectiva para suportar qualquer mazela devida à inevitável distracção dos outros. Na comunidade terrivel a disponibilidade é um desenvolvimento artistico da disciplina.

21. TANTO O DESEJO do Lider como o desejo de ser Lider sabem estar condenados a um fracasso invitável. Porque a mulher do Lider (todos o sabem) é a única a não ser victima da sua pantonima sedutora, na medida em que verifica quotidianamente o vazio: o privado dos dominantes é sempre o mais miserável. De facto o Lider é desejável no interior da comunidade terrivel como o é uma mulher altiva e sofisticada na democracia biopolitica. O desejo sexual que os homens e as mulheres dirigem ao Lider, e que lhe investe uma aura tão intensa que faz com que os olhares se voltem espontaneamente para ele, não é mais do que um desejo de humilhação. Deseja-se desnudar o Lider, ver o Lider satisfazer verdadeiramente e sem dignidade a parada de desejos que suscita para prevalecer. Todos odeiam o Lider, como os homens odeiaram as mulheres por milénios. No fundo todos desejam domesticar o Lider, porque todos detestam a fidelidade que lhe é velada.

CADA UM DETESTA O PRÓPRIO AMOR PELO LIDER.

22. O PESSOAL, na comunidade terrivel, não é politico.

23. O LIDER é sempre um homem porque age em nome do Pai.

24. AGE EM NOME do Pai aquele que se sacrifica. O Lider é, na verdade, aquele que perpetua a forma sacrificial da comunidade terrivel com o próprio sacrificio e com a exigência de sacrificio que faz pesar sobre os outros. No entanto já que o Lider não é o tirano – ainda que seja tiranico – não diz abertamente aos outros o que devem fazer; o Lider não impõe a sua vontade, mas deixa que se imponha orientado secretamente o desejo dos outros, que é sempre, em última análise o desejo de os agradar. À pergunta “Que devo fazer?” o Lider responderá sempre “Aquilo que quiseres” porque sabe que a sua mesma existência na comunidade terrivel impede os outros de quererem alguma outra coisa daquilo que quer ele.

25. AQUELE QUE AGE em nome do Pai não poder ser posto em discussão. Onde a força se transforma em ponto de discussão, o discurso reduz-se a balelas ou a desculpas. Enquanto existir um Lider – e portanto a sua comunidade terrivel – nunca haverá parrehsia e os homens, as mulheres e o próprio Lider estarão em exilio. Não se pode meter em questão a autoridade do lider enquanto os factos mostrarem que se o ama, ainda que se deteste o amor que se tem por ele. Acontece que o lider se meta em discussão a si próprio, e é então que um outro toma o seu posto, ou que a comunidade terrivel, tendo ficado acéfala, morra de uma lenta hemorragia.

26. O LIDER é realmente o melhor do seu grupo. Não usurpa o lugar de ninguém e todos estão conscientes de tal. Não tem de lutar pelo consenso, porque é ele que se sacrifica mais ou que é mais sacrificado.

27. O LIDER nunca está só, porque todos estão atrás dele, mas é ao mesmo tempo o icone da solidão, a figura mais trágica e iludida da comunidade terrivel. È só em virtude do facto do que esteja já à mercê dos outros (que não estão no seu lugar), que o Lider é por vezes verdadeiramente amado e preferido.

Peter Pàl Pelbart BIOPOLÍTICA E BIOPOTÊNCIA NO CORAÇÃO DO IMPÉRIO

July 8th, 2005
Friday 8 July 2005.

O Imperador da China resolveu, um belo dia, construir uma muralha para se proteger dos nômades, vindos do Norte. A construção mobilizou a população inteira por anos a fio. Conta Kafka que ela foi empreendida por partes : um bloco aqui, outro ali, outro acolá, e não necessariamente eles se encontravam. De modo que entre um e outro pedaço de muralha construído em regiões desérticas abriam-se grandes brechas, lacunas quilométricas (1). O resultado foi uma muralha descontínua cuja lógica ninguém entendia, já que ela não protegia de nada nem de ninguém. Talvez apenas os nômades, na sua circulação errática pelas fronteiras do Império, tinham alguma noção do conjunto da obra. No entanto, todos supunham que a construção obedecesse a um plano rigoroso elaborado pelo Comando Supremo, mas ninguém sabia quem dele fazia parte e quais seus verdadeiros desígnios. Enquanto isso, um sapateiro residente em Pequim relatou que já havia nômades acampados na praça central, a céu aberto, diante do Palácio Imperial, e que seu número aumentava a cada dia (2). O próprio imperador apareceu uma vez na janela para espiar a agitação que eles provocavam. O Império mobiliza todas suas forças na construção da Muralha contra os nômades, mas eles já estão instalados no coração da capital enquanto o Imperador todo poderoso é um prisioneiro em seu próprio palácio.

Kafka dá poucas indicações sobre os nômades. Eles têm bocas escancaradas, dentes afiados, comem carne crua junto a seus cavalos, falam como gralhas, reviram os olhos e afiam constantemente suas facas. Não parecem ter a intenção de tomar de assalto o palácio imperial. Eles desconhecem os costumes locais e imprimem à capital em que se infiltraram sua esquisitice. Ignoram as leis do Império, parecem ter sua própria lei, que ninguém entende. É uma lei-esquiza, dizem Deleuze-Guattari (3). Por que esquiza ? Talvez pela semelhança do nômade com o esquizo. O esquizo está presente e ausente simultaneamente, ele está na tua frente e ao mesmo tempo te escapa, sempre está dentro e fora, da conversa, da família, da cidade, da economia, da cultura, da linguagem.. Ele ocupa um território mas ao mesmo tempo o desmancha, dificilmente ele entra em confronto direto com aquilo que recusa, não aceita a dialética da oposição, que sabe submetida de antemão ao campo do adversário, por isso ele desliza, escorrega, recusa o jogo ou subverte-lhe o sentido, corrói o próprio campo e assim resiste às injunções dominantes. O nômade, como o esquizo, é o desterrritorializado por excelência, aquele que foge e faz tudo fugir. Ele faz da própria desterritorialização um território subjetivo.

Como pode o Império lidar com um território subjetivo de tal natureza ? Mas como pode ele deixar de lidar precisamente com isso ? Por mais que um Imperador tenha Muralhas concretas a construir, Império algum pode ficar indiferente a essa dimensão subjetiva sobre a qual ele se assenta primordialmente, sob pena de esfacelar-se – o que é ainda mais verdadeiro nas condições de hoje. De fato, como poderia o Império atual manter-se caso não capturasse o desejo de milhões de pessoas ? Como conseguiria ele mobilizar tanta gente caso não plugasse o sonho das multidões à sua mega-máquina planetária ? Como se expandiria se não vendesse a todos a promessa de uma segurança, de uma felicidade, o desejo de um modo de vida ? Afinal, o que nos é vendido o tempo todo, senão isto : maneiras de ver e de sentir, de pensar e de perceber, de morar e de vestir ? O fato é que consumimos, mais do que bens, formas de vida – e mesmo quando nos referimos apenas aos estratos mais carentes da população, ainda assim essa tendência é crescente. Através dos fluxos de imagem, de informação, de conhecimento e de serviços que acessamos constantemente, absorvemos maneiras de viver e sentidos de vida, consumimos toneladas de subjetividade. Chame-se como se quiser isto que nos rodeia, capitalismo cultural, economia imaterial, sociedade de espetáculo, era da biopolítica, o fato é que vemos instalar-se nas últimas décadas um novo modo de relação entre o capital e a subjetividade. O capital, como o disse Jameson, através da ascensão da mídia e da indústria de propaganda, teria penetrado e colonizado um enclave até então aparentemente inviolável, o Inconsciente. Mas esse diagnóstico é hoje insuficiente. Ele agora não só penetra nas esferas as mais infinitesimais da existência, mas também as mobiliza, ele as põe para trabalhar, ele as explora e amplia, produzindo uma plasticidade subjetiva que ao mesmo tempo lhe escapa por todos os lados, obrigando o próprio controle a nomadizar-se.

O Império contemporâneo, diferentemente do Império chinês do conto de Kafka, já não funciona na base de muralhas e trincheiras, e os últimos acontecimentos demonstraram cabalmente a falência da lógica da fortaleza. O Império se nomadizou completamente. Ou melhor, ele é a resposta política e jurídica à nomadização generalizada. Ele mesmo depende da circulação de fluxos de toda ordem a alta velocidade, fluxos de capital, de informação, de imagem, de bens, mesmo e sobretudo de pessoas (4). Claro que nem tudo circula da mesma maneira por toda parte, e nem todos extraem dessa circulação os mesmos benefícios. O novo capitalismo em rede, que enaltece as conexões, a movência, a fluidez, produz novas formas de exploração e de exclusão, novas elites e novas misérias, e sobretudo uma nova angústia – a do desligamento. O que Castel chamou de desfiliação, e Rifkin de desconexão. Ser ameaçado de desconexão, de desengate – sabemos que a maioria se encontra nessa condição, de desplugamento efetivo da rede. O problema se agrava quando o direito de acesso às redes, como o diz Rifkin (e agora trata-se não só da rede no sentido estrito, tecnológico e informático, mas das redes de vida num sentido amplo) migra do âmbito social para o âmbito comercial. Em outras palavras : se antes a pertinência às redes de sentido e de existência, aos modos de vida e aos territórios subjetivos dependia de critérios intrínsecos tais como tradições, direitos de passagem, relações de comunidade e trabalho, religião, sexo, cada vez mais esse acesso é mediado por pedágios comerciais, impagáveis para uma grande maioria. O que se vê então é uma expropriação das redes de vida da maioria da população, através de mecanismos cuja inventividade e perversão parecem ilimitadas.

Mas não deveríamos deixar-nos embalar por um determinismo tão apocalíptico quanto complacente. Parafraseando Benjamin, seria preciso escovar esse presente a contrapelo, e examinar as novas possibilidades de reversão vital que se anunciam nesse contexto. Pois nada do que foi evocado acima pode ser imposto unilateralmente de cima para baixo, já que essa subjetividade vampirizada, essas redes de sentido expropriadas, esses territórios de existência comercializados, essas formas de vida visadas não constituem uma massa inerte e passiva à mercê do capital, mas um conjunto vivo de estratégias. A partir daí, seria preciso perguntar-se de que maneira, no interior dessa mega-máquina de produção de subjetividade, surgem novas modalidades de se agregar, de trabalhar, de criar sentido, de inventar dispositivos de valorização e de auto-valorização. Num capitalismo conexionista, que funciona na base de projetos em rede, como se viabilizam outras redes que não as comandadas pelo capital, redes autônomas, que eventualmente cruzam, se descolam, infletem ou rivalizam com as redes dominantes ? Que possibilidade restam, nessa conjunção de plugagem global e exclusão maciça, de produzir territórios existenciais alternativos àqueles ofertados ou mediados pelo capital ? De que recursos dispõe uma pessoa ou um coletivo para afirmar um modo próprio de ocupar o espaço doméstico, de cadenciar o tempo comunitário, de mobilizar a memória coletiva, de produzir bens e conhecimento e fazê-los circular, de transitar por esferas consideradas invisíveis, de reinventar a corporeidade, de gerir a vizinhança e a solidariedade, de cuidar da infância ou da velhice, de lidar com o prazer ou a dor ? (5)

Mais radicalmente, impõe-se a pergunta : que possibilidades restam de criar laço, de tecer um território existencial e subjetivo na contramão da serialização e das reterritorializações propostas a cada minuto pela economia material e imaterial atual ? Como reverter o jogo entre a valorização crescente dos ativos intangíveis tais como inteligência, criatividade, afetividade, e a manipulação crescente e violenta da esfera subjetiva ? Como detectar modos de subjetivação emergentes, focos de enunciação coletiva, territórios existenciais, inteligências grupais que escapam aos parâmetros consensuais, às capturas do capital e que não ganharam ainda suficiente visibilidade no repertório de nossas cidades ?

Há alguns anos no Brasil eram visíveis configurações comunitárias diversas, ora mais ligadas à Igreja, ora ao Movimento dos Sem-Terra, ora às redes de tráfico, ou provenientes de movimentos reivindicatórios e estéticos diversos, como o hip-hop, ou modalidades de ’inclusão às avessas’ proporcionado pelas gangues de periferia (6), mantendo com as redes hegemônicas graus de distância ou enlace diversos. Eu não saberia dizer o que está nascendo hoje nos centros urbanos brasileiros, muito menos nas demais cidades do planeta. Mas há um fenômeno que me intriga, entre outros. No contexto de um capitalismo cultural, que expropria e revende modos de vida, não haveria uma tendência crescente, por parte dos chamados excluídos, em usar a própria vida, na sua precariedade de subsistência, como um vetor de auto-valorização ? Quando um grupo de presidiários compõe e grava sua música, o que eles mostram e vendem não é só sua música, nem só suas histórias de vida escabrosas, mas seu estilo, sua singularidade, sua percepção, sua revolta, sua causticidade, sua maneira de vestir, de “morar” na prisão, de gesticular, de protestar, de rebelar-se – em suma, sua vida. Seu único capital sendo sua vida, no seu estado extremo de sobrevida e resistência, é disso que fizeram um vetor de existencialização, é essa vida que eles capitalizaram e que assim se auto-valorizou e produziu valor. É claro que num regime de entropia cultural essa “mercadoria” interessa, pela sua estranheza, aspereza, visceralidade, ainda que facilmente também ela possa ser transformada em mero exotismo étnico de consumo descartável. Mas a partir desse exemplo extremo e ambíguo, eu perguntaria, também à luz dos nômades de Kafka a quem me referi no início, se não precisaríamos de instrumentos muito esquisitos para avaliar a capacidade dos chamados ’excluídos’ ou ’desfiliados’ ou ’desconectados’ de construirem territórios subjetivos a partir das próprias linhas de escape a que são impelidos, ou dos territórios de miséria a que foram relegados, ou da incandescência explosiva em que são capazes de transformar seus fiapos de vida em momentos de desespero coletivo.

Utilizando de maneira originalíssima textos de Gabriel Tarde, Maurizio Lazzarato debruçou-se recentemente sobre um feixe de questões correlatas (7), das quais reteríamos a seguinte: Que capacidade social de produzir o novo está disseminada por toda parte, sem estar essa capacidade subordinada aos ditames do capital, sem ser proveniente dele e nem depender de sua valorização ? A idéia de Tarde relida por Lazzarato, e que eu retomo nesse contexto de maneira excessivamente suscinta, é que todos produzem constantemente, mesmo aqueles que não estão vinculados ao processo produtivo. Produzir o novo é inventar novos desejos e novas crenças, novas associações e novas formas de cooperação. Todos e qualquer um inventam, na densidade social da cidade, na conversa, nos costumes, no lazer – novos desejos e novas crenças, novas associações e novas formas de cooperação. A invenção não é prerrogativa dos grandes gênios, nem monopólio da indústria ou da ciência, ela é a potência do homem comum. Cada variação, por minúscula que seja, ao propagar-se e ser imitada torna-se quantidade social, e assim pode ensejar outras invenções e novas imitações, novas associações e novas formas de cooperação. Nessa economia afetiva, a subjetividade não é efeito ou superestrutura etérea, mas força viva, quantidade social, potência psíquica e política.

Nesse contexto, as forças vivas presentes por toda parte na rede social deixam de ser apenas reservas passivas à mercê de um capital insaciável, e passam a ser consideradas elas mesmas um capital, ensejando uma comunialidade de auto-valorização. Ao invés de serem apenas objeto de uma vampirização por parte do Império, são positividade imanente e expansiva que o Império se esforça em regular, modular, controlar. A potência de vida da multidão, no seu misto de inteligência coletiva, afetação recíproca, produção de laço, capacidade de invenção de novos desejos e novas crenças, de novas associações e novas formas de cooperação, é cada vez mais a fonte primordial de riqueza do próprio capitalismo. Uma economia imaterial que produz sobretudo informação, imagens, serviços, não pode basear-se na força física, no trabalho mecânico, na automatismo burro, na solidão compartimentada. São requisitados dos trabalhadores sua inteligência, sua imaginação, sua criatividade, sua conectividade, sua afetividade – toda uma dimensão subjetiva e extra-econômica antes relegada ao domínio exclusivamente pessoal e privado, no máximo artístico. Como o diz Toni Negri, agora é a alma do trabalhador que é posta a trabalhar, não mais o corpo, que apenas lhe serve de suporte. Por isso, quando trabalhamos nossa alma se cansa como um corpo, pois não há liberdade suficiente para a alma, assim como não há salário suficiente para o corpo. Em todo caso, que a alma trabalhe significa, nos termos que mencionávamos há pouco, que é a vitalidade cognitiva e afetiva que é solicitada e posta a trabalhar. O que se requer de cada um é sua força de invenção, e a força-invenção dos cérebros em rede se torna tendencialmente, na economia atual, a principal fonte do valor. É como se as máquinas, os meios de produção tivessem migrado para dentro da cabeça dos trabalhadores e virtualmente passassem a pertencer-lhes. Agora sua inteligência, sua ciência, sua imaginação, isto é, sua própria vida passaram a ser fonte de valor. A associação e cooperação entre uma pluralidade de cérebros prescinde, no limite, da mediação do capitalista, tão decisiva num regime fordista.

Podemos retomar nosso leitmotiv : todos e qualquer um, e não apenas os trabalhadores inseridos numa relação assalariada, detêm a força-invenção, cada cérebro-corpo é fonte de valor, cada parte da rede pode tornar-se vetor de valorização e de autovalorização. Assim, o que vem à tona com cada vez maior clareza é a biopotência do coletivo, a riqueza biopolítica da multidão. É esse corpo vital coletivo reconfigurado pela economia imaterial das últimas décadas que, nos seus poderes de afetar e de ser afetado e de constituir para si uma comunialidade expansiva, desenha as possibilidades de uma democracia biopolítica.

Duas palavrinhas ainda. Uma a respeito do termo biopolítica e outra a respeito do termo multidão. Biopolítico foi o termo forjado por Foucault para designar uma das modalidades de exercício do poder sobre a vida, sobre a população enquanto massa global afetada por processos de conjunto. Um grupo de teóricos, majoritariamente italianos, propôs uma pequena inversão, não só semântica, mas também conceitual e política. Com ela, a biopolítica deixa de ser prioritariamente a perspectiva do poder tendo por objeto passivo o corpo da população e suas condições de reprodução, sua vida. A própria noção de vida deixa de ser definida apenas a partir dos processos biológicos que afetam a população. Vida inclui a sinergia coletiva, a cooperação social e subjetiva no contexto de produção material e imaterial contemporânea, o intelecto geral. Vida significa inteligência, afeto, cooperação, desejo. Como diz Lazzarato, a vida deixa de ser reduzida, assim, a sua definição biológica para tornar-se cada vez mais uma virtualidade molecular da multidão, energia a-orgânica, corpo-sem-órgãos. O bios é redefinido intensivamente, no interior de um caldo semiótico e maquínico, molecular e coletivo, afetivo e econômico, aquém da divisão biológico/mecânico, individual/coletivo, humano/inumano. Assim, a vida ao mesmo tempo se pulveriza e se hibridiza, se dissemina e se alastra, se moleculariza e se totaliza, se descola de sua acepção biológica para ganhar uma amplitude inesperada e ser, portanto, redefinida como poder de afetar e ser afetado, na mais pura herança espinosana. Daí a inversão, em parte inspirada em Deleuze, do sentido do termo forjado por Foucault : biopolítica não mais como o poder sobre a vida, mas como a potência da vida. A biopolítica como poder sobre a vida toma a vida como um fato, natural, biológico, como zoè, ou como diz Agamben, como vida nua, como sobrevida. É o que vemos operando na manipulação genética, mas no limite também no modo como são tratados os prisioneiros da Al Qaeda em Guantánamo, ou os adolescentes infratores nas instituições de “reeducação” em São Paulo – e os atos de auto-imolação espetacularizada que esses jovens protagonizam em suas rebeliões, diante das tropas de choque e das câmaras de televisão, não seriam a tentativa de reversão a partir desse ’mínimo’ que lhes resta, o corpo nú ? (8). Em contrapartida, a biopolítica concebida como potência de variação de formas de vida equivale à biopotência da multidão, tal como referida acima.

Ainda uma palavra sobre a multidão. Tradicionalmente o termo é usado de maneira pejorativa, indicando um agregado indomável que cabe ao governante domar e dominar. Já o povo é concebido como um corpo público animado por uma vontade única. Com efeito, como o diz Paolo Virno (9), e nas condições contemporâneas isso é ainda mais visível, a multidão é plural, centrífuga, refratária à unidade política. Ela não assina pactos com o soberano, não delega a ele direitos, inclina-se a formas de democracia não representativa. Talvez ela seja regida por uma lei-esquiza, tal como os nômades de Kafka. Numa fórmula sugestiva, Virno ainda diz : a multidão deriva do Uno, o povo tende ao Uno. O que é esse Uno do qual a multidão deriva ? Para ir rápido, é o que Simondon chamou de realidade pré-individual (e que os pré-socráticos chamavam de a-peiron, Ilimitado), que Tarde referiu como virtualidade, que Marx designou por intelecto geral. Chamemo-lo de caldo biopolítico, esse magma material e imaterial, corpo-sem-órgãos que precede cada individuação – a potência ontológica comum. De qualquer modo, por menos que se saiba que desenho pode ter uma democracia biopolítica, sabemos ao menos que ela está nas antípodas do que Canetti definiu com sendo a lógica da massa, com sua composição homogênea e compacta, com sua direção única e liderança unitária. A multidão, na sua configuração acentrada e acéfala, no seu agenciamento esquizo, testemunha de um outro desejo e de uma outra subjetividade.

Eu concluo. Talvez Foucault continue tendo razão : hoje em dia, ao lado das lutas tradicionais contra a dominação (de um povo sobre outro, por exemplo) e contra a exploração (de uma classe sobre outra, por exemplo), é a luta contra as formas de assujeitamento, isto é, de submissão da subjetividade, que prevalecem. Talvez a explosividade desse momento tenha a ver com a extraordinária superposição dessas três dimensões.

Volta a pergunta insistente : Como pensar as subjetividades em revolta ? Como mapear o sequestro social da vitalidade na desmesurada extensão do Império e na sua penetração ilimitada, tendo em vista as modalidades de controle cada vez mais sofisticadas a que ele recorre, sobretudo quando ele se realavanca na base do terrorismo generalizado e da militarizaçao do psiquismo mundial ? Mas como mapear igualmente as estratégias de reativação vital, de constituição de si, individual e coletiva, de cooperação e auto-valorização das forças sociais à margem do circuito formal da produção ? Como acompanhar as linhas de êxodo e desinvestimento ativo dos ’excluídos’, evitando enclausurá-los no território da exclusão, a exemplo daqueles que os privam da dimensão subjetiva e das linhas de escape que eles secretam a cada passo ? Em que medida a virtualidade da multidão extrapola o sistema produtivo atual com suas vampirizações, os modelos de subjetivação que ele engendrou (por exemplo, o do trabalhador assalariado), os cálculos do poder que ele suscita, a captura imperial e suas linhas de comando ? Além de recusar o sistema de valores e de exploração hegemônicas, como cria ela suas próprias possibilidades irredutíveis, mesmo quando isso é feito a céu aberto, nem que o Imperador esteja por perto, à espreita, espiando para ver no que poderia ele capitalizar aquilo que dele escapa ?

Não sei o quanto as poucas páginas de Kafka sobre a Muralha da China refletem a paranóia do Império contemporâneo, com suas estratégias frustradas para proteger-se dos excluídos que ele mesmo suscita, cujo contingente não pára de aumentar no coração da capital, numa vizinhança de intimidação crescente e num momento em que, como diria Kafka, sofre-se de enjôo marítimo mesmo em terra firme. Não sei o quanto os nômades de Kafka, na sua indiferença ostensiva em relação ao Império, não podem ajudar a pensar a lógica da multidão. Seja como for, em Kafka uma ironia fina vai solapando a solene consistência do Império. Há algo no funcionamento do Império que é puro disfuncionamento. Quando nas Conversas com Kafka, Janoush diz ao escritor checo que vivemos num mundo destruído, este responde : “Não vivemos num mundo destruído, vivemos num mundo transtornado. Tudo racha e estala como no equipamento de um veleiro destroçado.” Rachaduras e estalos que Kafka dá a ver, e que a situação contemporânea escancara. Talvez o desafio atual seja intensificar esses estalos e rachaduras a partir da biopotência da multidão. Afinal o poder, como diz Negri inspirado em Espinosa, é superstição, organização do medo : “Ao lado do poder, há sempre a potência. Ao lado da dominação, há sempre a insubordinação. E trata-se de cavar, de continuar a cavar, a partir do ponto mais baixo : este ponto … é simplesmente lá onde as pessoas sofrem, ali onde elas são as mais pobres e as mais exploradas ; ali onde as linguagens e os sentidos estão mais separados de qualquer poder de ação e onde, no entanto, ele existe ; pois tudo isso é a vida e não a morte.” (10)

1. F. Kafka, A grande muralha da China, São Paulo, Europa América, 1976.

2. F. Kafka, “Uma folha antiga” (texto complementar ao A grande muralha da China), in Um médico rural, trad. Modesto Carone, São Paulo, Cia das Letras, 1999.

3. G. Deleuze e F. Guattari, Kafka – Por uma literatura menor, Rio de Janeiro, Imago, 1977.

4. Cf. Toni Negri e Michael Hardt, Empire, Paris, Exils Ed. 2000.

5. F. Guattari, “Restauração da Cidade Subjetiva”, in Caosmose, Rio de Janeiro, Ed. 34, 1992.

6. Glória Diógenes, Cartografias da cultura e da violência. Gangues, galeras e o movimento hip hop, São Paulo-Fortaleza, Secretaria da Cultura e do Desporto, 1998.

7. M. Lazzarato, Invention et travail dans la coopération entre cerveaux, Essai sur la théorie sociale de la différence de Gabriel Tarde, à paraître.

8. Maria Cristina Vicentin, Rebeliões da juventude, tese, inédito.

9. Paolo Virno, “Multitudes et principe d’individuation”, in Multitudes n. 7, Paris, 2001.

10. T. Negri, Exílio, São Paulo, Iluminuras.